João* chegou há dez horas a uma boate em São Paulo e já transou com 20 homens. Com alguns, foi ativo; com outros, passivo. A seu lado, outros jovens fazem sexo quase sem parar. A pausa é só para potencializar a experiência com alguma droga. Seja com poppers, vendido como aromatizador de ambiente em alguns países, com GHB, a mais famosa entre os frequentadores do local, ou com outras, todos ali têm algo em comum: são adeptos do chemsex. O nome é a combinação das palavras chemical sex, ou sexo químico em português.
A prática, bastante comum entre homens gays e bissexuais na Europa, começa a se espalhar no Brasil. As grandes cidades, como São Paulo, Rio de Janeiro e Salvador, têm algumas festas onde se drogar e transar com várias pessoas são sinônimos, mas o chemsex também pode ser feito a dois. É como Gabriel Souza, farmacêutico de 28 anos, prefere. Quando começou a praticar, há dez anos, ele nem sabia o que era. “Só fui conhecer o termo chemsex quatro anos depois, quando morei em Barcelona”, conta.
A primeira experiência do farmacêutico nesse universo foi no início de sua vida sexual com homens – antes, ele já havia transado com algumas mulheres. Gabriel havia saído com um cara mais velho duas vezes e, no terceiro encontro, o parceiro perguntou se ele queria experimentar o GHB, que em altas doses se torna o “boa noite, Cinderela”, enquanto transavam. Sem titubear, Gabriel, que nunca havia provado nenhuma droga, entrou na onda. “Ele me passou confiança e acabei curtindo. A droga aumenta as sensações, então, fiquei com os sentidos mais aguçados, me sentindo mais sensual e com mais tesão”, lembra ele. Depois daquela vez, passou a se relacionar com frequência usando alguma substância – além de tomar GHB, fuma cristal, ou tina, alguns dos apelidos dados à metanfetamina. Atualmente, a cada dez transas, sete envolvem algum aditivo.
“A droga aumenta as sensações, então, fiquei com os sentidos mais aguçados, me sentindo mais sensual e com mais tesão”
Gabriel Souza
![Chemsex 2 -](https://preprod.elastica.abril.com.br/wp-content/uploads/2021/01/Chemsex-2.jpg?quality=70&strip=info&w=724)
Mas, se Gabriel, assim como João, não tem medo de reagir mal à droga, muitos amigos dos dois não possuem a mesma sorte. “Não conheço ninguém que tenha morrido fazendo chemsex, mas já vi muita gente passando mal, entrando em paranoia nas sex parties“, diz o farmacêutico. Em comum, os dois garantem não ter receio, pois têm controle sobre a situação. “Quando alguém passa mal, a gente sabe que essa pessoa exagerou e eu sempre uso dentro dos meus limites, então, nunca tive nenhum problema relacionado a isso”, diz Gabriel. Para João, o fato de ele usar estimulantes, e não alucinógenos, ajuda. “Gosto de saber o que está acontecendo. Sei que é estranho dizer que tenho controle porque todo mundo fala que tem e acaba passando mal, mas eu sinto que estou no comando. E não sou irresponsável”, afirma.
Não ser irresponsável, no caso de João, significa não ingerir mais de uma dose de G, o apelido do GHB, em menos de uma hora. Mesmo se não tiver batido o efeito, ele espera. Um mililitro a mais em um curto período de tempo pode levar à morte. O negócio é tão sério que, em algumas festas que frequenta, o anfitrião faz os convidados anotarem em uma lousa o horário em que consumiram a droga para, caso misturem com outras, possam consultar a tabela e evitar uma overdose.
“Gosto de saber o que está acontecendo. Sei que é estranho dizer que tenho controle porque todo mundo fala que tem e acaba passando mal, mas eu sinto que estou no comando. E não sou irresponsável”
João*